Se a gente pudesse ou tivesse que escolher uma data para um segundo aniversário, eu escolheria 11 de dezembro. A depender do referencial que se tenha, um ano pode ser muito ou pouco tempo... Foi exatamente há um ano, ou melhor, um ano e um dia, que eu renasci. Parabéns para mim. Sim, eu mereço. E não há modéstia que vá me impedir de afirmar isso.
O ano de 2016 tinha começado com uma grande transformação, uma mudança drástica no meu campo profissional. Comunicadora de formação (graduada em Publicidade e Jornalismo), sempre fui encantada pela área que escolhi para atuar profissionalmente mas, durante algum tempo trabalhei na área administrativa. Até que depois de muitos "não" eu ouvi um "sim". (Sim, eu não desisto fácil das coisas nem das pessoas). Após os minutos iniciais de incredulidade onde me questionei se estava sonhando ou acordada, felicidade era o meu nome.
Os primórdios no setor de Comunicação da organização onde trabalho foram maravilhosos. Minha vida estava toda "conto de fadas", feliz na profissão, iniciando relacionamento amoroso. E cinco anos se passaram. Chegamos em 2016. As coisas já não andavam bem há algum tempo, e de forma geral, embora eu não estivesse percebendo ou inconscientemente me recusando a ver. O lado profissional era o que mais me incomodava, estava me conduzindo a um adoecimento emocional. Trabalhar em alguma coisa que eu goste sempre foi importante para mim e o setor de Comunicação estava tomando rumos diferentes do que acredito, de forma que em alguns momentos eu precisava passar por cima de alguns princípios pessoais para cumprir com as minhas obrigações.
Eu pensava, pensava, pensava, mas não encontrava uma solução diferente: eu precisava sair do setor. Não decidi de imediato, porque não era tão fácil para mim abrir mão da minha área de formação para me aventurar em terrenos desconhecidos. Recebi uma proposta para atuar na Gestão de Pessoas. Enchi-me de coragem e aceitei. A então chefe do setor é minha amiga pessoal e confiou cegamente no meu trabalho. A presença dela, independente da condição hierárquica, era a segurança que eu precisava para os primeiros passos. E foi assim que logo depois do Carnaval, quando o ano realmente começa em Salvador, comecei a trabalhar com programa de estágio.
Hoje posso dizer que foi uma das decisões mais acertadas que tomei em toda a minha vida. Gosto muito do que faço e descobri um lado que eu não conhecia em mim e que me enche de orgulho e alegria. Na primeira semana, a vontade foi de largar tudo e sair correndo gritando, porque era muito diferente do que eu estava acostumada. Até que... "eureka"!!!! Eu precisava seguir as normas, mas tinha liberdade para criar o fluxo de trabalho do meu jeito, o que estava dificultando a minha adaptação era a tendência que temos a seguir a forma de trabalhar de quem estamos substituindo, afinal, aprendemos com o futebol que em time que está ganhando não se mexe. Bastou colocar as coisas do meu jeito e pronto, parecia que eu fazia aquilo há décadas.
E o que isso tem a ver com o 11 de dezembro? Com a felicidade voltando ao campo profissional, o lado pessoal começou a ganhar mais minha atenção. Ainda de forma intuitiva, as percepções começaram, mas talvez eu não desejasse observar mais atentamente ou alguma outra coisa me impedia de ver claramente. O fato é que eu só entendi que a minha alegria tinha ido embora quando ela voltou. Eu ainda não sabia, mas ela estava começando a voltar naquele 11 de dezembro.
Era um domingo ensolarado na capital baiana, início da tarde, e eu estava dirigindo em uma avenida que tem velocidade máxima de 80km/h. Com algumas obras de mobilidade urbana no entorno, apesar do fluxo bem mais tranquilo aos domingos, o trânsito parou. Ouvi uma frenagem brusca e senti o impacto, que arremessou o meu carro contra o carro da frente. O motorista do carro da frente veio até mim e antes que ele falasse qualquer coisa eu disse "eu não tive culpa, bateram em mim". Ele respondeu "eu sei, está tudo bem?" Sim, estava tudo bem.
Desci do carro e observei que o motorista causador do acidente não tinha saído do carro. O vidro da janela tinha uma película escura, não era possível enxergar o ocupante. O outro motorista e eu fomos até lá e quando nos aproximamos ela (era uma mulher e confesso que isso me deixou com raiva por dois minutos) baixou o vidro e disse que era para ficarmos tranquilos que a seguradora dela arcaria com o nosso prejuízo. Só depois de ver que ela estava bem eu olhei para o meu carro para ver em que situação ele se encontrava. O fundo estava completamente destruído. A estrutura estava retorcida, e as portas não abriam, exceto a do motorista. Eu estava com brinquedos no carro, que seriam doados para crianças que escreveram cartinhas pedindo presentes ao Papai Noel (os presentes ficaram intactos, apesar da destruição, e eu também).
Não vou detalhar muito a situação já que o texto ficou um pouco extenso pela contextualização que quis fazer ( e ainda não acabou). Vamos pular para a parte em que eu já estou em casa e percebo que há um hematoma na minha perna. Descobri da pior forma possível que precisamos colocar alguma coisa entre a bolsa de gelo e a pele para evitar queimaduras. É, eu que saí ilesa de um acidente relativamente grave, provoquei uma queimadura em mim mesma.
No dia seguinte veio a segunda pancada. Chegando da concessionária, onde deixei o carro para avaliação, o marido me comunica que está voltando para a casa da mãe, que o casamento acabou. Era a este momento que eu me referia na postagem inicial deste blog, quando falei que começou tudo a desabar na minha cabeça. Não vou entrar em detalhes sobre isso também. Dois dias depois do acidente, a seguradora da motorista que causou o acidente concluiu que o carro teve perda total. Com a estrutura retorcida, partes importantes relacionadas à segurança foram comprometidas. Só então eu tive ideia da gravidade do choque e do que poderia ter acontecido.
Em um próximo post eu falo um pouco mais sobre a separação e a superação. Vamos ao trecho final sobre o acidente (as minhas amadas metáforas). A queimadura deixou uma cicatriz em forma de coração (tem metáfora mais linda do que essa?). Eu não percebi de imediato (acho que sou um pouco retardada, percebo as coisas nos outros bem mais fácil do que em mim), mas uma garota na academia comentou sobre meu "sinal de nascença". Sim, ficou parecendo um sinal de nascença e inspirou uma postagem toda poética minha nas redes sociais (um dos melhores textos que já escrevi, apesar de bem pequeno). No começo eu queria que a cicatriz desaparecesse mas depois que vi o formato de coração eu mudei de ideia.
A outra metáfora, para encerrar, é sobre o carro. Eu gostava do meu carro sinistrado, achava que nunca mais ia querer trocar e que seríamos felizes para sempre. Poucos dias depois, eu aluguei um carro de outra marca/modelo. Para minha surpresa, eu me apaixonei pelo veículo assim que o coloquei em movimento pela primeira vez. Nos entendemos muito bem, parecia que a gente já se conhecia há anos. Eu nem queria devolvê-lo à locadora, nem lembrava que tive outro carro antes dele. Acabei comprando um igual para mim. E a metáfora do carro transcendeu para a vida. Conheci outro homem depois da separação, ou melhor, acho que o reconheci. Desde a primeira vez que os meus olhos o viram eu tive a certeza de que era ele que eu esperava a vida toda. O encantamento também foi imediato e acredito que mútuo também, mas diferente da história do carro essa (ainda) não tem um final feliz. Deve ser porque ainda não acabou...
O que fica de lição de tudo isso? Primeiro, a atenção no trânsito e como o celular pode "roubar" essa atenção e trazer graves consequências. A motorista disse que não viu o trânsito parar e por isso colidiu. Celular? Talvez. Não posso afirmar que ela estava ao celular, mas infelizmente é uma prática comum nas vias soteropolitanas dirigir com um olho no trânsito e o outro no WhatsApp. Pare em qualquer semáforo e observe os motoristas ao redor. Quase todos estarão checando mensagens nos comunicadores instantâneos. Tornam-se vítimas mais fáceis da violência urbana ou das "buzinadas" de outros motoristas impacientes se atrasam a partida quando a luz verde volta ao semáforo.
A segunda lição é que muitas vezes não entendemos o porquê de alguma coisa que acontece, mas acredito que tudo tem um propósito, algo a nos ensinar. O acidente não me matou, pelo contrário, ele me fez viver de forma mais plena porque passei a ver o mundo com os outros olhos. Uma vez escrevi uma frase para um amigo dizendo que com ele aprendi que o pretérito é imperfeito, o futuro é condicional e o presente é uma dádiva, por isso tem esse nome: presente. Aprendi, mas deixei de praticar e caiu no esquecimento (como as fórmulas de Física, como um novo idioma, como os gráficos das equações). O acidente trouxe a frase de volta e uma coisa que parecia ruim acabou se transformando em algo de bom pelo crescimento que tive. Como escrevi no texto a que me referi mais acima, precisamos enxergar os corações nas cicatrizes. E as cicatrizes nos corações também.
E é por tudo isso que 11 de dezembro poderia ser meu aniversário. Renasci.